terça-feira, 14 de outubro de 2008

All the small things

Depois de horas de jogos de video-game e de apanhar um pouco dos primos menores que me escalavam e de algumas merecidas risadas saía, voltava para o quintal de casa sendo atingido no pé pela bola de futebol meio surrada.

- Você nunca foi bom nisso, será que aprendeu alguma coisa?

Meu pai sabia ser irritante as vezes, ele era melhor do que eu em muitas coisas mas sempre quis que eu o superasse... As vezes eu tinha vergonha do que eu era, imaginava o que poderia vir a ser, mas nessa hora sacudia a cabeça e voltava a realidade, colocava o pé sob a bola, erguendo-a no ar e tocando de cabeça para o coroa que a segurava nas mãos.

- A gente se esforça e acaba melhorando em certas coisas.

Ele sorriu, eis algo que eu não via com frequência, ele entrava fazia um gesto para que eu o acompanhasse e eu o fazia, lembrava de quando era garoto e estava na hora de dormir como corria para dentro de casa, pulava na cama e esperava uma história, passava pela estante da sala, deslizando as pontas dos dedos por tantos livros que lera em tempos passados, passava pela cozinha, podia lembrar de ficar ali vendo a mãe cozinhar tentando roubar algo para mastigar aqui e ali, meu quarto, tanta coisa já mudou nele, do berço a mini cama, a cama, ao colchão no chão pra ter espaço para tanta quinquilharia que colecionava, livros, revistas, cds, hoje era o escritório do meu pai, mas porque eu quis assim, meu colchonete ainda está enrrolado atrás do armário, eu posso ver, certas coisas nunca mudam, chegava ali onde ele sentava em uma cadeira, oferecendo-me a outra onde eu rapidamente ficava, encostando-me esperando o que viria.

- Eu soube que seu tio faleceu esta madrugada, op pessoal lá fora também, a festa praticamente acabou com isso, eu queria saber como você está...

Eu não havia entendido a pergunta, séries de pensamentos dessa madrugada passaram pela minha cabeça em um segundo, mas havia parecido uma eternidade...

- Eu vi o que aconteceu, todos sabíamos que seu tio era corrupto, que recebia propina, ele sempre pareceu cuca fresca, mas o que ele fez me fez pensar, como qualquer um de nós um dia pode pirar com as coisas que acontecem, pirar com um imposto que aumenta, uma injustiça, uma imagem que nos passam por e-mail de uma criança com fome, eu sempre fiz tudo para ser um bom exemplo para você, para seus irmãos... Você se distanciou muito desta família, eu queria saber como você está. Pode ser sincero com seu velho pai, sempre fui seu amigo, sempre vou ser.

Lembram do que falei sobre se sentir pequeno? Como alguém compete com isso? Eu li uma vez que nós somos apenas um grão de areia no deserto, mas sem esse grão o deserto ficaria incompleto, ou algo assim, cada um de nós têm um papel aqui nesta vida, era difícil saber exatamente qual e normalmente perdemos nosso tempo fazendo perguntas nos questionando sobre o quão grande poderíamos ser. Mas quando eu lembrava daquele senhor na minha frente eu lembrava que poderíamos ser apenas nós, simples, um pai, uma mãe, um filho, um irmão, o importante é qualquer coisa que sejamos sejamos os melhores no que fazemos, ou pelo menos nosso suor caia até que tenhamos dado tudo de nós, ele era isso, ele escolheu ser um pai e sempre foi o melhor. Sabem, no fundo eu tenho orgulho disso, cada vez que eu faço o que faço sei que não vão machucar meu velho pai, sei que outras famílias vão se manter unidas sabendo que têm um criminoso a menos na cidade, quem sabe um dia eu não terminava o serviço e não podia deitar minha cabeça nessa casinha de subúrbio, depois de um dia normal de trabalho, depois de um jantar com a família, irritado se os filhos estavam com notas baixas?

- Eu vou bem pai, eu li o jornal, soube do meu tio, mas eu ainda sou só um eletricista comum.

Alguém acreditou nessa, nem eu acreditei.

- Filho você tá precisando de uma namorada...

Ele ria, sabia que não estava tudo bem, mas deixava claro que se eu precisasse estaria lá para mim. Será que um dia eu seria assim... Peraí, volta a fita, ele disse namorada? Engraçado, agora que ele mencionou.

- Têm uma garota pai, eu conheci um dia desses, como aquela pancada que você leva na cabeça nem sabe de onde veio, naquele dia que se está vendo o jornal e derrepente você sente seu coração bater rápoido sem aviso prévio.

Tá, agora sim foi verdade. impressionando o quão verdade.

- Filho, ouvindo você falar assim eu acredito que logo quem sabe eu não conheça uma futura nora.

Ele dava aquele tapinha no meu ombro que deixaria qualquer um desconcertado, levantava caminhando para fora.

- Foi bom te ver filho, tenta vir mais.

- Valeu pai...

Eu fiquei ali naquela cadeira por mais alguns minutos, pensando na vida, pensando em mim, pensando em... Que porra é essa!? A voz no jornal, era ela, mas a notícia fazia meu sangue ferver.

- "Hoje ao meio dia foram roubadas as ferramentas e a máscara do Anjo da Morte, parece que alguém com um mal gosto para piadas pretende continuar o serviço do vigilante mascarado."

Justamente o que eu precisava, são minhas coisas eu ia roubá-las de volta numa hora propícia, agora têm um maníaco mascarado que pensa que sou eu a solta por aí, eram várias despedidas, abraços, abraçoas apertados de consolo para a família, tinha choro e eu queria ficar, mas eu precisava pensar. A noite iria cair, alguém iria morrer e o maníaco com minhas coisas poderia atacar qualquer pessoa... No caminho para casa dentro do ônibus pensava sobre onde iria começar a procurar, talvez fosse hora. Em casa ia para o banho, se arrumava, vestia a camisa de lenhador, a calça jeans, ia para o carro, sem ferramentes esta noite, eram quase seis horas. Saía pegando a estrada novamente...

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Continua no próximo episódio...

Frase do dia: "O final do arco íris com o pote de ouro pode estar do seu lado, mas você sabe COMO procurar?"

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi!
É difícil comentar em blogs. Geralmente leio e ponto. Agora essa sua história me fez lembrar de um seriado que adoro o Dexter. Vc já assistiu?
Beijos!!!
Ká.